terça-feira, 1 de julho de 2014

Carta Aberta

  A seguir transcrevemos a Carta Aberta enviada ao Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, António Costa:



Exm. Sr. Presidente da Câmara Municipal de Lisboa,
Caro Dr. António Costa,


Fazendo fé no que a comunicação social informou, a viabilidade da construção de um parque de estacionamento automóvel na Praça/Jardim do Príncipe Real, mereceu da parte de V. Exa. a afirmação de que  ‘não é para já’.  Esta terá sido a expressão usada para sintetizar a sua posição, no debate sobre o assunto ocorrido na Assembleia Municipal do passado dia 17 de Junho.
Senhor Presidente, um ‘não é para já’ não basta. A nós, cidadãos e residentes, e às organizações cívicas que representamos, um ‘não é para já’ não nos sossega, antes pelo contrário, deixa-nos muito inquietos. Por isso apelamos ao seu proverbial bom senso e ao seu intransigente sentido de defesa dos interesses dos cidadãos para não ceder a injustificados interesses de terceiros, para, agindo com base nos poderes que os cidadãos desta cidade recentemente lhe conferiram, transformar esse ‘para já, não’ num ‘para nunca mais’. Para nunca mais se voltar a falar numa tal monstruosidade.
Senhor Presidente, como antigo residente na zona, e profundo conhecedor dos problemas que a afectam, tem com certeza noção de que os problemas que a construção de tal parque se propõe obviar não só não serão resolvidos, mas, antes pelo contrário, agravados.
O brutal acréscimo de tráfego viário, que as condicionantes ao trânsito na Avenida da Liberdade - facto agravado pela recente explosão do comércio e ‘gentrificação’ da zona - provocaram no eixo Chiado-Rato só poderá agravar-se ainda mais com a oferta das centenas de lugares de estacionamento previstos para o parque. É sabido que a oferta incrementa a procura pelo que o aumento do tráfego na zona e especificamente no referido eixo não é uma mera hipótese mas sim uma certeza. Ora, como certamente os serviços da Autarquia a que V. Exa preside, terão já recolhido dados e feito estudos, o trânsito nesse eixo atingiu o ponto de saturação não só nas chamadas horas de ponta como em muitos outros períodos do dia, pelo que qualquer incremento nesse trânsito vai tornar a vida insuportável quer para residentes quer para quem é obrigado a utilizar essa via de comunicação. Acresce que a poluição atmosférica que se faz cada vez mais sentir, irá, como é óbvio, aumentar ainda mais, ultrapassando os limites toleráveis para a saúde humana, para não falar da de outras espécies vivas. Acresce que a entrada e saída de veículos do parque será mais um obstáculo à fluidez do tráfego.
Os aspectos negativos da construção de tal parque na Praça/Jardim do Príncipe Real, não se ficam, contudo, pelo acréscimo do trânsito e consequentes malefícios já referidos.
A esse aspecto há que acrescentar ainda outros, não menos graves, entre os quais sobressai a impossível convivência com o Reservatório da Patriarcal e o conjunto de galerias subterrâneas que dela emanam.
A “Patriarcal”, como V. Exa. sabe, faz parte do Aqueduto das Águas Livres, Monumento Nacional. A construção de um parque com vários pisos subterrâneos paredes meias com essa construção do século XVIII, além da forte probabilidade de lhe causar danos, directa ou indirectamente, através da alteração do regime de infiltração das águas pluviais, irá inviabilizar a futura candidatura a Património da Humanidade desse Monumento Nacional.
Além da “Patriarcal” também o Jardim, tão maltratado na ‘requalificação’ de 2009, será seriamente prejudicado pela construção do parque subterrâneo. Duvidamos mesmo que consiga sobreviver se essa construção for avante. Nesse Jardim, autêntico oásis para caminhantes e turistas, existem 7 árvores classificadas, sendo uma delas ex-libris de Lisboa.
A construção do parque além de roubar área ao Jardim - muitos dos recém-plantados lódãos da envolvente, terão de ser abatidos - irá afectar o sistema radicular de todas as árvores aí existentes, incluindo as 7 classificadas, o que será a sua sentença de morte.
Não exageramos nem falamos de cor. O uso de maquinaria pesada e abertura de profundos roços para instalação do novo sistema de iluminação no Jardim, durante os trabalhos de 2009/10, por nós atempadamente e publicamente denunciados, mostraram-se e continuam infelizmente a mostrar-se, altamente prejudiciais para a saúde das árvores, como a ‘taxa de mortalidade’ entretanto verificada entre as espécies do Jardim o comprova.
Ora, se uma intervenção superficial, que pretendia requalificar o Jardim, causou os estragos que são do conhecimento geral e até, recentemente, reconhecidos publicamente pela tutela, que pensar de uma intervenção em profundidade e que envolverá forçosamente meios e maquinaria muitíssimos mais agressivos?
Outro aspecto ainda que há que considerar com muita apreensão é o do impacto negativo que a construção de um parque com 4 pisos subterrâneos e pelo menos 12 metros de profundidade, terá sobre os edifícios centenários que ladeiam a praça. É que as paredes exteriores desse parque ficariam a escassos metros das fundações desses edifícios, que não poderão deixar de se ressentir quer com as vibrações e trepidações do terreno durante a fase de construção, quer com as consequências que a mudança do regime de infiltração das águas pluviais produzirá ao longo do tempo.
Aliás, os estudos técnicos encomendados para suportar o projecto em apreço, são claros quando afirmam que os impactes negativos nas estruturas dos edifícios que bordejam a praça, e no aqueduto, não estão estimados e, pior, podem ser irreversíveis.
O equilíbrio estético da praça/jardim é outro dos aspectos a considerar. É óbvio que por mais cuidado que se tenha, a construção do parque irá impor a implantação de mais painéis de sinalização aumentando ainda mais a poluição visual da praça/jardim. Mas mais grave ainda para a preservação da estética da praça será a construção dos pórticos de entrada e saída do parque.
Senhor Presidente, como o senhor saberá, melhor do que ninguém, o problema da fluidez do tráfego na zona e da escassez de lugares de estacionamento não se resolverá com mais oferta de lugares, pois, como já acima afirmamos, a mais oferta sucede mais procura. Esse problema resolve-se, pelo contrário tomando medidas de desincentivo ao trânsito de veículos particulares e aumentando e melhorando, simultaneamente, a oferta do transporte público.
Senhor Presidente, permita-nos que parafraseemos a célebre frase de Ronald Reagan:
 Deite abaixo este parque’.

Pela Plataforma Contra a Construção do Parque,
Amigos do Príncipe Real
Liga dos Amigos do Jardim Botânico
Fórum Cidadania Lisboa
Associação Lisboa Verde
Cidadãos subscritores das Petições Contra a Construção do Parque

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